quinta-feira, 23 de junho de 2016

Não

Um dia eu aprendi a dizer não, tem gente que nem acredita, pensa que eu nasci sabendo, bom, não foi assim.. Eu precisei aprender, eu achava bonito quando ouvia alguém dizer que um "não" evita muito problema.. Eu que nasci assim problemática achei que poderia me ajudar, aí eu comecei timidamente a dizer não, insegura, e como alguém que experimenta cerveja ou um baseado pela primeira vez eu gostei, nunca mais parei. Hoje em dia é não pra tudo, não até por impulso, tanto que eu preciso fazer um exercício contrário a favor do "sim". Um dia foi sim pra -quase- tudo, hoje quase nada tem meu sim. Eu tenho um problema que criaram um nome engraçado, sincericídio. Eu no impulso já respondi que não é bem assim, não sou eu que estou errada por falar o que eu quero falar, mas sim você, que não usa uma capa protetora de verdades. Não que eu não pense isso, não evolui ainda pra achar outra solução, não que de bom grado também eu me ache a mais correta do mundo, eu não sou, mas é desse jeitinho que eu tenho vivido. Primeiro eu aprendi a dizer não, depois aprendi a dizer sim, ainda hoje eu não aprendi a controlar meus impulsos de fala, eu praticamente vomito diariamente coisas que ninguém gosta de ouvir, mas eu PRECISO dizer. 
Eu preciso? 
Meu exercício agora é outro. Eu não falo mais. 
Eu só vou falar, na hora de falar,  então eu escuto. 
Eu preciso de ajuda, um exercício que não me imagino fazendo é não responder uma pergunta que me fizeram em dois míseros segundos, como se fosse um tiro no peito de quem fez mal a minha mãe, minha resposta é rápida e impensada, porque eu tenho as respostas para todas as perguntas. 
Eu tenho a resposta para todas as perguntas?
Certamente eu não tenho, sou um rio de conflitos. 
Muitas vezes minhas respostas são reflexos imaturos, como defesa, muitas vezes eu acerto. Meu raciocino é rápido, menos na hora da prova, que tudo falha. Mas isso se dá porque eu não gosto de ser provada. Eu me sinto ofendida quando me pedem provas, satisfações ou quando sou duvidada. E é aí que eu erro a resposta a esse exercício que eu me esforço tanto. 
Eu me esforço tanto? 
É, eu erro feio e perco a razão. Quem é você pra duvidar de mim? E se por acaso for realmente uma mentira tudo que eu ajo, penso ou digo? Não é direito meu? Eu tiro  de alguém o direito da mentira?
Eu não condeno a falha, não, eu não condeno. Eu posso no impulso da arrogância expor a falha alheia -não que eu tenha algo a ver com isso, eu não tenho, mesmo que a falha me atinja, não sou dona da consciência de ninguém- mas não, condenar eu não condeno. Eu acho errado julgar, mas é claro que não é por isso que eu não julgo, eu julgo veladamente, e me julgo por julgar, eu confesso que não sou dona nem de mim, eu mesma não sei me controlar, dentro do revés da minha arrogância, sou a maior crítica de mim, mas mas tenho a humildade de justificar todos os meus erros, assim justifico os erros da humanidade, afinal eu nasci de Eva, tenho o pecado original. Eu não teria problema nenhum em assumir que não tenho caráter, seria até mais fácil, mas eu tenho sim. E é verdade que eu perdi boa parte da minha ternura, não tenho jeito pra falar com ninguém, não tenho jeito. De jeito nenhum. Eu era uma criança meiga, e não só por achar bonito eu parei de dizer sim, deve ter algum motivo maior, não pode ter sido só por vaidade, mas eu não lembro, se eu lembrasse escreveria, afinal estou escrevendo pra mim, algum médico da alma diria que esqueci por ato falho, e por ato falho eu também perdi a ternura, endureci. Eu amo de um jeito diferente, nem melhor nem pior. Ninguém ama igual, mas todos querem resultados iguais. Eu posso dar um resultado igual ao de alguém, eu não sou singular, o peso dos meus excessos passados não justifica os vazios de agora. Ou justifica? Eu não sei, nem acredito ter me excedido tanto, não me considero um exagero, mas acho que sou. Às vezes. 

Não dá pé, não tem pé nem cabeça, não tem ninguém que mereça, não tem coração que esqueça, não tem jeito mesmo.

Não posso me sentir afastada. Isso é um defeito que eu compartilho com o mundo, cair na consciência de que se está por fora de tudo, que o mundo as vezes me esquece e eu não tô causando o efeito que eu vim pra causar. Que eu acho que vim. Eu quis descobrir o mundo sozinha, porque ninguém no mundo tem os mesmos desejos ao mesmo tempo, e se tem é só por hora. Desse jeito também eu endureci: quer estar comigo esteja, não quer, não esteja. Dói em mim, mas só na hora. Eu quero amolecer, amolecer não é mole, é exercício, é erro, é ansiedade, é recaída. No processo de amolecimento da minha vida eu preciso de amor, mas aqui agora eu não quero responsabilizar ninguém, porque eu já fui amada e deixei esse amor de lado, afinal eu PRECISAVA endurecer, era a meta da minha vida dizer NÃO. Mas agora... Agora eu decidi dizer sim, eu preciso aceitar o amor e as intempéries do amor. Eu esqueci a imagem do chão e não é tão difícil olhar pra ele hoje, o difícil é me fazer acreditar. Pode levar anos, ou não. Eu acho que não preciso mais ficar sozinha, eu não preciso descobrir esse mundo sozinha. 
E quando eu quiser e precisar descobrir sozinha um mistério? 
O amor não espera. 
Eu decidi a m o l e c e r 
Dizer sim. 
Quando me abri pro não, disse vários, muitos sim. Abri a fresta da alma e deixei entrar, mas eu calculei tudo: ninguém entrou pra ficar. Meu não é treinado. 
Agora eu sou só sim não calculado. 
Não é fácil, mas eu quero andar de mãos dadas, não é fácil, mas eu preciso ainda ter a liberdade desse não, pra não envergar e atrapalhar tudo, 
Eu apelo: Deus, não me tira a habilidade do não como castigo. A minha dureza foi conquistada. Deus, me ensina o equilíbrio. Eu não posso ser só sim, a minha natureza vai morrer. Deus, me dá a liberdade de andar calada quando eu não quiser dizer nada. Me dá isso como forma de a m o l e c e r. 
Eu quero andar junto, sozinha eu já sei como é. 

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